O rock sempre foi associado à guitarra e vice-versa, e a maioria das bandas sempre seguiram o padrão de formação guitarra-baixo-bateria. Algumas incorporaram DJs, outras não usaram baixo e algumas até incluíram violino misturado às guitarras. Porém, do underground de São Paulo, a Deadman Dance foi um pouco mais ousada: adotou o violino e deixou a guitarra de lado. Isso mesmo, a banda faz rock sem guitarra, mas com muito peso e distorção. E isso pode ser escutado no último EP lançado pela banda.
O trio, formado por Eduardo Geraissate (violino e vocal), Rafaela Antonelli (bateria) e Henrique Codonho (baixo – e responsável pela arte da capa do EP), reuniu os três singles já lançados, “(In)sane”, “Hard Times” e “Another Day”, e mais três músicas inéditas, formando, assim, Ticking Clocks, que saiu no começo deste mês. Com influências que vão desde Nirvana e Queens of the Stone Age até MPB, Ticking Clocks imprime a cara da Deadman Dance e sua sonoridade única.
“O nosso som vai no sentido contrário da música de orquestra, sendo direto, rápido e agressivo em boa parte das vezes. Aqui, o violino abandona o conceito de instrumento melódico, cuidando na maioria das vezes da parte harmônica, com o baixo fazendo as melodias entremeadas. A bateria aparece e costura tudo com precisão”, explica Eduardo, violinista da banda.
O EP começa com “Another Day”, que chega com o pé na porta e um solo rasgado do violino. A letra fala da esperança e desesperança do cotidiano, a lei do eterno retorno de Nietzsche, e da permanência nesse tempo cronológico, mas, apesar de sua complexidade, não deixa de ser aquela música que gruda na cabeça e você se pega cantando sozinha durante o dia.
Just another day/ And it feels the same/ A shadow is on it’s the way/ Fear is here to stay (Só mais um dia/ E parece o mesmo/ Uma sombra está a caminho/ O medo veio pra ficar)

Na sequência, vem “Thunder Clouds” que, segundo a banda, é uma mistura de punk com bolero. Essa mistura inusitada resultou em uma faixa que, se eu estivesse em um karaokê, seria a música que eu cantaria a plenos pulmões, pois o refrão é melancólico e libertador, como um bom rock triste deve ser.
Depois dessas duas faixas com cara de hit, “Won’t” chega mais pesada e carregada de distorção com uma letra que mais parece um mantra, repetido durante toda a música:
I will not hide from you/ So go and fuck yourself/ I won’t let you get in/ I will not bow (Eu não vou me esconder de você/ Então vá se f****/ Eu não vou deixar você entrar/ Eu não vou me curvar)
A banda conta que “Won’t” era pra ser apenas instrumental, mas ganhou uma letra feita em 2018, ano da fatídica eleição presidencial. “É a nossa posição, de que não vamos abaixar cabeça ou aceitar abusos de nenhuma forma”, diz a banda.
Então, entramos na segunda metade do EP, com “Hard Times”, que de acordo com a Deadman dialoga com o clássico “Manic Depression” de Jimi Hendrix, falando sobre um cotidiano desgastante de alguém que vive na cidade grande. A melodia repetida casa perfeitamente com a letra angustiante e você consegue se ver repetindo todas as coisas todos os dias enquanto ouve a faixa.
Ticking Clocks se encerra com “(In)sane”, da qual já falamos por aqui, e a última faixa, homônima. Se as duas primeiras músicas me fizeram ter vontade de cantar, as duas últimas me fizeram querer dançar: apesar das letras, que seguem a vibe melancólica e pesada que permeia todo o EP, as melodias de “(In)sane” e “Ticking Clocks” são dançantes, rápidas e mostram uma sonoridade mais punk da Deadman. Importante falar que “Ticking Clocks” é outra faixa que faz a gente se questionar como aquele som tá saindo de violino, de tanta distorção.
O EP tem produção, mixagem e masterização de Alyson Borges (Cavalo Estúdio), e é um lançamento conjunto dos selos Howlin’ Records, Oxenti Records e Fuzzy Cracklins (EUA). A pré-venda funcionou no mesmo esquema de “Aposentadoria”, da Letty, com recompensas diferentes dependendo do valor pago, e ficou no ar até o dia 30/9, mas agora já é possível ouvir Ticking Clocks em todas as plataformas digitais.