
Quando eu fui ouvir Cordilheira, terceiro álbum da Versus Mare, confesso que não sabia nada sobre a banda. Fazia tempo que eu não encarava um álbum às cegas assim e o melhor de tudo isso, além de ter conhecido uma boa banda, foi ouvir as músicas sem pré-julgamentos.
Enquanto eu ouvia o álbum, a primeira coisa que me veio à mente foi que a sonoridade da Versus Mare é muito original. Às vezes a gente ouve uma banda e nos primeiros acordes já sabemos quais são as maiores influências, a qual subgênero do rock a banda pertence, etc. Mas com a Versus Mare é quase impossível, porém, ao ouvir Cordilheira as influências culturais do continente sul americano ficam claras; não à toa a primeira palavra do disco é “América”, na música Equatorial, que fala sobre o calor e força dos sul-americanos que buscam um continente sem interferência dos lobos de Wall Street que vêm da América do Norte.
Muitas das outras faixas do álbum também lidam com essas questões políticas e sociais do continente, outras abordam questões mais sentimentais, como tristeza e ansiedade, caso de Navalha e Caos (uma das melhores do álbum), Pétala e Incêndios. Também há faixas que mesclam esses sentimentos com as questões políticas, como O Enforcado que elenca todos os problemas micros e macros do dia a dia sul-americano e a angústia que isso causa.
“Cultura branca de mercado/ Contaminação sabor limão/ Caos embalado pra viagem/ Pilha de corpos, porcentagem/ Livre de qualquer gordura-trans/ Nunca dormir, sempre acordar/ Cruzar os braços e aceitar/Cartas e bulas e estrelas/ Mapas astrais pra navegar/ Essa carne podre é teu algoz/ Fronteiras sempre fechadas/ Sísifo sempre a retornar/ É cocaína o sangue do herói”.
Como o álbum gira em torno da América do Sul, a natureza também se faz presente. Em Rupestre, a banda busca a “força sagrada, som de chuva”, elemento que também está em Galeões, faixa seguinte.
O curioso é que ao fim do álbum busquei mais sobre a banda e li o release do disco, disponível na página oficial da Versus, que diz: “A mistura das distorções pesadas de guitarra com ambientações mais cálidas fazem de Cordilheira um manto sonoro variado, porém coeso. Tal diversidade reflete e busca amplificar as vozes diversas que ecoam nos quatro cantos do continente e que ainda hoje lutam por seu lugar”.
Então, se o objetivo da banda era esse, foi alcançado, já que a cada música eu senti como se viajasse por alguma parte desse continente de luta e tão rico culturalmente. Cordilheira é sobre a América, sobre a natureza e sobre as nossas raízes, que como diz a letra de Continente Extraviado – menor e mais profunda música do álbum – sempre vão ficar, mesmo que esmaguem nossas flores com o peso de botas.