O Bayside Kings está à todo vapor realizando shows e divulgado novos trabalhos em uma fase totalmente nova da banda como grupo. Segundo Milton Aguiar, vocalista do BSK, as mudanças envolvem mais do que só apenas canções em português, mas de postura e forma de enxergar a vida. No último sábado, 12 de agosto, acompanhamos a apresentação da banda durante o SMASHPIT FËST, realizado no Hangar 110. Além do BSK, o evento misturou o crossover, trash metal e hardcore com as bandas Mukeka di Rato, DxFxCx, Eskröta e Imminent Attack (veja no final da conversa o vídeo da cobertura do fest pelo Nada Pop).
Por onde vá, o Bayside consegue reunir um público considerado novo junto com veteranos do cenário. Esse tem sido um dos méritos da banda que sabe que não basta um aptidão para a música e bons shows, e sim muita mão na massa no dia a dia em diversos temas que envolvem divulgação, agendas, merch, redes sociais entre outras coisas para levar o som e, principalmente, o nome da banda para mais lugares e pessoas.
Nessa entrevista com o Milton conversamos sobre os lançamentos do BSK, bem como sobre a vida, pandemia, underground e diversos outros temas que podem dar uma visão mais ampla de como um dos integrantes pensa sobre a atuação e a importância do grupo. Uma conversa franca sobre viver o underground que não se resume a 60 ou 90 minutos de show em cima do palco.
NADA POP – Em que fase o Bayside Kings está na carreira? Em uma entrevista para o canal ESSA É MINHA CARA você menciona que a banda passou por um reboot. Mas como é um início com dez anos de carreira?
MILTON: Obrigado Maurício pelo espaço e interesse em saber um pouco mais sobre nós. O BSK está neste reboot de vida e carreira, porém com uma diferença, é como começar algo novo, porém com a experiência de uma década de acertos e erros, o que nos faz ter uma visão mais ampla de onde podemos ir e o que vamos precisar pra chegar nesses novos objetivos.

NADA POP – Quanto que o Bayside é a sua vida no dia a dia? É o seu principal trabalho? Vocês possuem outros trabalhos e como atuam para dividir o tempo com a banda com as outras coisas da vida? E que conselhos você daria para quem está enfrentando dificuldades de alinhar o tempo dos ensaios, dos shows, com outras coisas da vida (trabalho, família, etc.).
MILTON: Em questão de tempo de vida diário, o BSK, ocupa uma parcela diária de trabalho do meu empenho, pois além de gerenciar redes sociais, eu ainda vejo partes burocráticas da banda com parceiros. Também voltei a fazer as relações de marcações de shows. Às vezes tenho que atuar com a parte gráfica de algumas coisas também, fora ensaiar, estudar exercícios de voz e criações para contribuir com o corre num total.
O BSK não é meu principal trabalho, porém hoje eu posso dizer que ele é um complemento de renda. Há uns anos eu me dedico forte a estudo de gerenciamento de tempo para que eu possa entender e atuar com cada coisas em seu lugar e de forma 100% nelas, seja como BSK, gestor de tráfego e marketing digital, companheiro e outras áreas em que eu atue. Dá pra fazer essas coisas, a diferença é agarrar o que é essencial.
No time, todos nós temos outras atividades, hoje eu trabalho com autogestão voltada 100% para marketing e tráfego para área da música. O Manolo (baixista), trabalha com área de logística portuária, o Teteu (guitarra) trabalha com conferência portuária e o David (bateria) trabalha com autogestão em fogões e similares.
Todos nós temos nossas jornadas de vida individuais e o coletivo formamos o BSK. Falando por mim, eu sacrifiquei muita coisa, não me arrependo, não posso voltar no tempo, talvez algumas coisas eu poderia ter feito diferente. O que eu posso contribuir para quem estiver nessas encruzilhadas da vida é: seja adulto na hora de encarar as coisas, não da pra ganhar e fazer tudo, mas é importante saber o que é essencial na vida e o que não for um sim óbvio nela, então é um não, e desde então minhas tomadas de decisões e organização tem sido mais prática.
NADA POP – A pandemia (o período mais intenso da doença) foi o momento mais difícil da carreira da banda? Claro, além de cancelamento de shows, como você passou a enxergar a vida e a própria música depois desse período?
MILTON: Sobre este momento ímpar na vida de todo mudo, com o BSK, foi o momento de rever as coisas, de aprender novas coisas. Então cada um de nós buscou novas habilidades. Eu estudei novas ferramentas de marketing, fiz aulas de canto, fiquei com mais dúvidas do que certezas, quis desistir de muita coisa e ao mesmo tempo foi um momento de reencontro e mudança comigo mesmo, de estilo de vida, de qualidade de relações. Eu poderia contar várias histórias tristes aqui, mas eu prefiro valorizar o corre da mudança.
Sobre o BSK, não tínhamos shows, não tínhamos dinheiro, tínhamos novas músicas para gravar. Tivemos que entender que esse tempo seria para acelerar alguns planos, um deles era a mudança do inglês para o português, o famoso reboot citado. O que nos ajudou de verdade, foi a criação da nossa comunidade chamada de UNDERDOGS.
Durante esse período na “jaula”, nós conseguimos captar recursos com essa comunidade, graças uma venda de merch, com um desenho feito por mim e deixar os objetivos abertos para todo mundo. A galera abraçou a ideia e engajou, com isto, nós conseguimos durante as fases de flexibilizações, ensaiar e gravar essas músicas. E com isto, nós conseguimos em 2021 lançar a primeira parte do álbum conceito #LIVREPARATODOS chamada EXISTÊNCIA e em 2022 com a liberação de socialização, voltar a fazer shows e lançamentos. E foi nesse período que descobrimos que não estávamos sós e ao mesmo tempo que tivemos suporte, também tivemos que saber devolver e ser suporte para as pessoas.
NADA POP – Vocês acabaram de lançar (DES)OBEDECER, o primeiro single do EP Dualidade. Vamos ver se entendi certo. Ao todo serão 4 EPs, com 4 faixas cada. Os EPs lançados até agora são Existência (2021), Tempo (2022) e agora o novo single do EP Dualidade (2022), que ainda terá 3 faixas e, posteriormente o quarto e último EP que juntos irão formar o álbum #livreparatodos. Entendi certo? Como surgiu esse conceito e se vocês se inspiraram em alguma outra banda ou artista para isso.
MILTON: Entendeu perfeitamente. Lembra do lance do reboot com experiência? Nós do BSK percebemos que esta mudança da língua, seria uma mudança muito dura de impacto dentro da galera que nos dá suporte e se a gente fizesse de uma vez, um lançamento único, teríamos que ter uma produção muito elevada e isto não conseguíramos, porque não teríamos tempo e finanças para fazer tal coisas até formar um set list 100% em português e rápido, fora o receio de rejeição que tínhamos na época.
Então, dentro das minhas competências com o BSK, eu fui estudar lançamentos, plataformas, redes sociais e busquei dores e pontos de vistas de artistas que estavam lançando coisas nos últimos anos. E dentro do time percebemos que teríamos que mudar alguns comportamentos e depois de toda essa pesquisa e aprendizado, nos organizamos, planejamos e estamos agindo.
Para isto, criamos um álbum 100% em português, fragmentamos ele em 4 partes: EXISTÊCIA (2021), TEMPO (2022), DUALIDADE (2023) e (R)EVOLUÇÃO (2024). Cada um tem 4 sons, e além dos sons, eles contam uma história, inspirada em obras como Watchmen, V de Vingança e pulp fiction.

Criamos uma mascote, um símbolo, que carinhosamente ficou como “caveirinha”, que é uma máscara que simboliza em primeiro lugar nossa auto revolução e com isto, engajamento de coletividade. O lance da caveira aparece com a simbologia de unidade em que várias culturas ela é tratada. Então essa revolução, a máscara, ela não tem gênero, não tem cor, pode ser eu, pode ser você, pode ser nós.
Buscamos neste álbum, entrelaçar política e entretenimento, com capas que lembram muito quadrinhos e um dia vou revelar todas as influências, estamos contando essa história nos clipes, onde passamos em vários universos e realidades que misturam live action e animação. E todos os clips se ligam, no final, a ideia é virar um curta. Então tudo referente a este lançamento, foi pensado, foi estudado e está sendo feito com carinho.
Depois dos últimos EPs, no próximo ano faremos uma box comemorativo que irá reunir todas as partes em um lançamento físico e limitado. Dentro da banda, nossa cabeça já está planejando o próximo passo da parada para ser respondido em 2025.
Mas foi graças a este movimento do #LIVREPARATODOS em que o BSK dá um salto de alcance e relacionamento, estamos colhendo o que plantamos nesse tempo em que ficamos na “jaula”. Se não fosse este ímpeto de fazer as coisas, mudar e pensar em engajamento de comunidade, talvez poderia nem ter mais BSK, porque ainda estamos vivendo as marcas desses últimos anos.
NADA POP – “Não é porque é underground que deve ser feito de qualquer jeito”, essa também foi a sua frase (se me lembro bem) na mesma entrevista que citamos. Você percebe que estamos evoluindo no nosso cenário em relação a isso ou tem muita coisa ainda que poderia ser feita de forma melhor, mas não é? E que exemplos você poderia dar de cuidados mesmo com música, projeto gráfico e até mesmo na venda de merchan?
MILTON: Sempre dá pra melhorar, esse lance de ser feito de qualquer jeito, não cola, não pra mim. Então as coisas em que tenho atuação e que tenham minha paixão, minha dedicação, elas merecem atenção.
As informações e ferramentas estão aí, na maioria das vezes disponíveis e forma gratuita para geral aprender. Até 2019 a gente não sabia registrar músicas, não sabia fazer muita coisa que é do nosso direito e obrigação como músicos a executar. E eu acredito que quando você não tiver tempo para aprender e tiver algum recurso, invista ou em capacitação ou procure pessoas com o conhecimento específico para ajudar.
Tem que tratar o seu corre, seja ele qual for com carinho, tem que ter ambição, tem que saber o que você quer fazer e como fazer. Pra algumas pessoas, pode bater como sonhador, se você não fizer nada, realmente é sonho. A partir do momento que você consegue metrificar e saber onde você está, onde você quer chegar e como chegar, aí vira objetivo e fica totalmente palpável.
Eu sei, parece bagulho de coach, pra mim funciona e se não tiver propósito, vontade e ação, então pra mim não serve. A gente tem que ser feliz, e sobre isto eu ouvi algumas coisas de pessoas diferentes que é a mais pura realidade. Felicidade é o caminho e gente feliz não enche o saco de ninguém. E nós somos adultos e esta é a realidade.

NADA POP – Cantar em português tem sido mais fácil ou mais difícil e como essa adaptação de língua se desenrolou até vocês sentirem que estava legal o som e pronto para ser gravado? Tem facilitado mesmo a conexão com o público? Estão recebendo bem os lançamentos de vocês nessa nova fase?
MILTON: Durante estes 10 anos de BSK, eu sempre fui questionado, seja no Brasil ou nas tours que fizemos fora, por que não cantávamos em português? No começo, eu não sentia a necessidade, pelo fato de todas as minhas influências que eu aplico no BSK, eram de bandas gringas.
Com o tempo, algumas necessidades foram aparecendo, especialmente com o momento sociopolítico que passamos em 2016 pra frente. Com isto, eu sentia a necessidade de me posicionar mais explicitamente e começou a bater a ideia de mudar de língua, porque a mensagem é muito importante e ela tem que ser feita de forma direta e horizontal. Vivemos em um país continental, o BSK vai passar mais tempo atuando aqui do que fora. Então tudo isto levava para a gente mudar a comunicação, para ampliar conexão e diálogo com as pessoas que dão e quem também não tem simpatia pelo BSK
Então, todos olhos, internos e externos estavam na minha direção. Foi como mergulhar num vazio. Então fui ouvir outras coisas que gosto tanto quanto hardcore punk que é o rap. Consumi numa velocidade maior do que antes, para aprender sobre flow e métricas em português. Lembro de ouvir algumas coisas clássicas do MPB e rock brasileiro como Belchior e Cazuza com o ouvido de apreciar e aprender e me ajudou muito e outro exemplo que utilizei era o lance de abrasileirar as minhas métricas, peguei como exemplo o Badauí do CPM22 que teve a maestria de pegar métricas do Face to Face e fazer isto em português e com tudo isto chegamos no feito da primeira música em português do BSK chamada EXISTÊNCIA em 2018
Então desde 2018, estamos inclinados dentro deste lançamento que é o #LIVREPARATODOS. Acreditamos que estamos no caminho certo, a galera tem recepcionado bem e com isto, novas pessoas tem aparecido nos shows também. Foi algo que demorou só 10 anos para eu aceitar e arriscar.
NADA POP – Estamos vivendo uma fase de algumas bandas voltando e o Fernando Sanchez publicou em sua rede social dizendo o seguinte: “Eu acho muito massa essa onda de volta de banda e toda atenção e mídia que isso tem gerado. Mas acho importante o pessoal também valorizar quem não parou, quem seguiu tocando, se fodendo, lançando disco, fazendo show, mesmo quando ninguém mais estava afim de achar isso legal”. O que pensa sobre essa ideia que o Fernando lançou?

MILTON: concordo 100% com o mestre Saches. Acho legal quando as bandas e artistas vêm o novo e se sentem inspirados a voltar e fazer o corre sincero. Do mesmo jeito que vejo e sei de bandas/artistas que voltaram pelo hype e querem voltar com o mesmo prestígio de antes como se o tempo não tivesse passado, ignorado por ego tudo o que aconteceu e tem acontecido nessa pausa dela.
Eu acredito que essa história toda cabe uma frase do Alexandre Magno: “tem que saber chegar, tem que esperar sua vez…”. O que for de verdade vai ficar e o que for fugaz vai desaparecer do mesmo jeito que veio e o tempo continua.
NADA POP – Segundo o Spotify, o rock é o terceiro gênero mais ouvido na plataforma. No entanto, as bandas mais ouvidas ainda são Charlie Brown Jr., Skank, Legião Urbana, Titãs e O Rappa por meio do serviço. Mas para os fãs de rock, entendo que isso seja uma boa notícia e talvez ajude a alavancar outros estilos mais pesados dentro do próprio gênero e, consequentemente, ajudar na viabilização de shows. Como banda, sentem alguma melhora nesse sentido ou está tudo igual?
MILTON: Eu sinto que há uma vontade de misturar mainstream e submundo, como também estilos sonoros e acho muito válido. Acredito que também ninguém é obrigado a nada e cada pessoa entende sua responsabilidade e papel nessa vida. Eu acredito muito em saber servir e devolver para formar um ecossistema sustentável, mas não posso esperar isto dos outros para não causar frustração.
A resposta final dessa pergunta para mim é muito “depende”, depende de onde você está, com quem você está e para onde você quer ir.
O Bayside Kings foi um das bandas que participou do SMASHPIT FËST que foi realizado no Hangar 110, no dia 12 de agosto. Para esse fest conseguimos a participação com a ajuda do BSK. Valeuu!