Na estrada desde 2012, a banda de trashpunk Surra saiu de Santos e é hoje um dos maiores nomes do underground do Brasil, famosa por seus shows catárticos e letras diretas sobre política.
Formada por Leeo Hanna (vocal e guitarra), Guilherme Elias (baixo) e Victor Miranda (bateria), a banda relançou em maio de 2021 seu primeiro álbum, Tamo na Merda, de 2016, remasterizado e renomeado de Tamo Muito na Merda.
Trocamos uma ideia com Guilherme e Victor sobre este último lançamento, a adaptação da banda ao momento de isolamento social sem shows, política, planos para o futuro e até “feat dos sonhos” e versões do Charlie Brown Jr.
Todo brasileiro sabe o porquê de “estarmos na merda”, em 2016, e agora “estarmos muito na merda”, em 2021, mas a vontade da banda de relançar o disco vem apenas do cenário político ou tem algo a mais? Quando surgiu essa ideia?
Guilherme: Como as cópias físicas do Tamo na Merda já estavam ficando bem difíceis de encontrar no mercado, vimos a necessidade de fazer uma nova versão deste material. Aproveitamos para fazer o relançamento com esse nome, pois algumas músicas desse álbum, infelizmente, são bem atuais 5 anos depois.
Quais as maiores diferenças entre o Tamo na Merda e o Tamo Muito na Merda a respeito de gravações e até mesmo da maturidade da banda, já que entre um e outro se passaram 5 anos?
Guilherme: Basicamente, é um projeto gráfico novo, com pôster, no qual a pessoa encontra tanto a capa original do Tamo na Merda quanto a nova. Além disso, o álbum foi totalmente remasterizado pelo Leeo e ficamos bem contentes com o resultado. Inclusive, voltamos a incluir alguns sons que nunca tocamos anteriormente desse álbum no nosso setlist como “Aceitar é o Caralho” e “Nasce, Cresce, Morre e Some”.
Aproveitando o nome do disco, a gente sabe que uma banda independente de rock no Brasil passa por muitos momentos “tamo na merda”, mas com a pandemia, existem perrengues que vocês agora até sentem falta?
Victor: Com certeza. Todos que já tiveram uma banda, fazendo turnê constantemente na estrada, sabem as dificuldades físicas e mentais que se passa. Não é fácil, mas, ao mesmo tempo, é o combustível de nossas vidas. É um relacionamento complexo, mas aposto que todos estão sentindo muita falta.

Mas a vida não é só perrengue, né? Em 9 anos de banda, qual foi o momento mais legal da história do Surra?
Guilherme: Eu destacaria as duas tours da Europa e também a abertura dos shows comemorativos de 30 anos do Brasil do Ratos de Porão no SESC Pompeia.
Victor: Acho que todas as vezes em que eu percebi que eu estava muito além do que eu tinha esperado para tudo isso, foram momentos muito legais. E a banda segue me surpreendendo…
Quem ouve o Escorrendo pelo Ralo (álbum de 2019) encontra, no meio de um disco de thrashpunk, um samba. Vocês gostam mesmo do gênero? Qual outro gênero musical ou artista específico que foge totalmente do estilo da banda vocês curtem e os fãs nem imaginam?
Guilherme: Eu fui criado no meio do samba e do pagode e ainda escuto muito o gênero. Inclusive, comecei a tocar cavaquinho antes de tocar baixo. Os caras também gostam bastante do estilo um pouco por influência minha e também por que tem uma questão nostálgica. O pagode foi gigante na Baixada Santista quando éramos crianças, rolava em todos os programas de rádio e levamos isso até hoje.
Victor: Eu, pessoalmente, gosto muito de hip hop e todas as suas variantes. Acho que o pessoal deve imaginar, ainda mais porque o público do Surra é cabeça aberta para vários tipos de som.
Na última live que vocês fizeram no YouTube, rolou uma brincadeira dos fãs, quando vocês falaram sobre BBB, pedindo um feat do Surra com o Fiuk. A gente sabe que isso provavelmente não vai rolar (infelizmente hahaha), mas sobre colaborações, se vocês pudessem escolher algum artista ou banda nacional pra gravar com vocês, qual seria o “feat. dos sonhos”?
Guilherme: Meu feat dos sonhos seria uma participação do Eduardo Taddeo, ex-Facção Central em um som nosso.
Victor: Eu queria um dia tocar junto com uma bateria de escola de samba. Já fizeram essa ideia antes, mas, em termos de realização musical, pra mim seria maravilhoso.
Quando o STF anulou a condenação do Lula, vocês postaram comemorações nas redes sociais da banda, porém, muitas pessoas que se consideram de esquerda ou que se opõem ao Bolsonaro evitam falar a favor do Lula. Vocês tiveram que lidar com “hate” de alguns fãs por terem se posicionado a favor dele especificamente?
Victor: Nós compartilhamos manifestações dos próprios fãs da banda comemorando. Acho que essa “depuração” de haters de direita já foi feita faz muito tempo, justamente porque estamos falando desses problemas também já fazem alguns anos e as pessoas sabem da nossa posição. A maioria das pessoas que curtem o nosso som concordam, e há também os que não concordam e curtem quietos, até porque sabem que não vão arranjar nada discutindo com a gente.
E no geral, vocês já tiveram o posicionamento político de vocês questionado pelo público, seja aqueles que chegaram ao Surra por conta do Like a Texas Murder (banda formada por Leeo e Victor antes do Surra) ou que alegam gostar “apenas do instrumental”? Como lidam ou o que pensam sobre?
Victor: Eu acho que cada um é livre para curtir o que quiser. Lá no começo, isso era muito mais frequente. É claro que a banda trata de temas políticos muito efervescentes, isso vem junto no pacote, mas acho que eu fico até lisonjeado com o fato de alguém conseguir apreciar o valor musical da parada, descartando esse aspecto.
E para concluir essa parte, sabemos que é difícil prever cenários, mas o que acham ou esperam que aconteça nos próximos capítulos da política brasileira?
Victor: Eu espero que o povo saiba a força que tem e não saia das ruas até derrubar o governo genocida do Bolsonaro e de todos os direitistas malucos que se apossaram da situação no País. Tem que cair toda essa gente do PSDB, militares, juízes, todos juntos. Somente uma reviravolta radical na situação política pode resolver os nossos problemas. As eleições de 2022 ainda estão longe…
Em 2019, vocês lançaram um EP só de covers de bandas de Santos, há alguma chance de sair um volume 2 do Expropriando sua Fábrica? Se sim, quais bandas gostariam de gravar? E o cover tão pedido de Charlie Brown Jr. vai rolar?
Guilherme: Queremos sim que essa seja uma série de EPs em homenagem às bandas da Baixada Santista, e estamos já maquinando como será a próxima versão, talvez só com bandas que cantam em inglês agora. E sobre o Charlie Brown Jr., ainda estamos pensando sobre, mas existe sim uma possibilidade.
E falando em Santos, a cidade é conhecida por muitas bandas que saíram de lá. Vocês têm acompanhado o cenário atual da cidade? Se sim, quais bandas novas vocês indicam?
Victor: O cenário atual é um pouco triste comparado com o que já foi. Santos virou, basicamente, uma cidade de idosos endinheirados que acumularam grana a vida toda em São Paulo e foram se aposentar no litoral. Todos os “jovens” em algum momento se veem tendo que sair da cidade para conseguir alguma coisa. Apesar de tudo, ainda tem os que resistem por lá. Eu destacaria o pessoal do The Scuba Divers.
O Thrashpunk Teleport: Submundo 2121 (EP de 2021) foi lançado com um gibi, que ilustra o cenário distópico das letras. Como surgiu essa ideia de lançar EP + Gibi e quais foram as inspirações pra HQ? Vocês leem muita distopia? Pretendem fazer uma parte 2 dessa história?
Victor: Eu dei essa ideia da HQ em alguma viagem de carro, voltando de algum show, e todo mundo embarcou na piração. Para a história, nos inspiramos em filmes distópicos como Exterminador do Futuro, Eles Vivem… É um tema bem recorrente de novo, né? Com a possibilidade do nosso mundo simplesmente acabar de uma hora pra outra na mão de uns malucos… E vamos ver, no final desse quadrinho deixamos um gancho preparado para uma parte 2. Se rolar, vai ser muito massa.
E pra fechar, quais os próximos planos do Surra no mundo pós-pandemia? Há alguma possível comemoração de 10 anos de banda?
Victor: Se tudo der certo e em 2022 estivermos todos vacinados, vamos seguir na nossa filosofia de não parar de produzir material em estúdio e de não tirar o pé da estrada.
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