Para os fãs do gênero stoner, no dia 10 de agosto foi lançado o “Leading to Nowhere”, da banda recifense Slowner. Apesar de não ser o primeiro lançamento do grupo, que desde 2019 possui outros trabalhos publicados em plataformas de streaming, a carga de “Leading…” demonstra uma maturidade bem interessante para músicos com idades entre 23 e 27 anos.
O grupo, fortemente inspirado por bandas como Kyuss e Black Sabbath, lançou seu EP de estreia em 2019. Cinco faixas que mostravam todo o peso que a banda tinha o do que estaria por vir. No entanto, com o período da pandemia, a banda acabou sofrendo uma baixa com a saída do ex-vocalista Lucas Valença, que também era o guitarrista. Mas com a chegada de Gabriel Sena assumindo os vocais e a continuação de Renata Ramos (baixo), Gabriel Maia (bateria) e Isaac Freire (guitarra), o grupo criou um novo corpo sonoro que em nada deixou a desejar lançamentos anteriores.
Mas antes disso tudo acontecer, o grupo já se mostrava com bastante fôlego para seguir a estrada. Além de shows por cidades como Natal e João Pessoa, o grupo chegou a sair em turnê como a “Slow Bloody Caravan”, projeto que reunia a Slowner (Recife), a Casquetaria (São Paulo) e a Sangue, banda italiana de stoner/doom. A tour representava uma parceria entre as bandas e o selo californiano Fuzzy Cracklins, que acabou trabalhando com outros grupos do gênero para divulgação e promoção de merch em outros países.
Desse projeto, inclusive, saiu a coletânea “Slow Bloody Caravan”.
Ainda no ano de 2020, o grupo lembra que lançaram o single “Flood of Hell” que teve a participação de Fish McRave da banda Sangue nos vocais, faixa que tem uma vertente mais doom do que stoner nos mais de oito minutos de música. Mas saindo desse tempo para 2023, questionei a Slowner a respeito das temáticas desse novo lançamento. Já que o gênero stoner é carregado de assuntos como viagens (em diversos sentidos), festas e drogas, quais temas a banda trazia para o álbum “Leading to Nowhere”?
O vocalista Sena comenta que, em comparação com o primeiro disco, o novo trabalho passa por mais temas e de forma mais trabalhada. A primeira faixa, 90 Days, conta a história de uma pessoa que vive “no rolê” e usa muitas substâncias, mas não se deu conta ainda do próprio vício e do quão destrutivo isso é para ela e para as pessoas ao seu redor. “É a única música que aborda esse tipo de temática ‘stoner’, mas de forma mais irônica através de um personagem baseado numa pessoa real”, diz.
Já as outras músicas seguem outra proposta, como explica. “Seer traz uma história da mitologia grega para ilustrar experiências pessoais e Frontline faz algo parecido com uma letra sobre guerra. Control é uma música sobre a sensação de alienação pelo trabalho corporativo e Dire Cycles é mais psicológica e é um fluxo de pensamento sobre nossas ‘sombras’ internas”.
Pernambuco, a terra do… Stoner?
O nordeste do Brasil é uma grande mistura de elementos musicais e culturais, carregado de obras clássicas do folclore nacional. É natural que a maior parte das pessoas só conheça musicalmente Pernambuco como a terra do frevo. Mas como uma banda de rock, ainda mais de stoner, conseguiu nascer e se impor? Esse questionamento foi respondido pelo baterista da banda.
“Pernambuco é um estado multicultural, e aqui tem por característica a convivência de vários gêneros musicais acontecendo na cidade ao mesmo tempo. A nossa história, para gostar e ter uma banda de rock, acredito que é a mesma de muita gente, foi acontecendo por influências de parentes, ouvindo as bandas clássicas e nós ouvindo por tabela (risos). A partir daí vai muito do seu interesse em querer continuar a descoberta sem fim que é a música e o rock em específico… desde que eu me entendo por gente, seguro um violão na mão, desde a época que eu sabia 2 acordes ou o riff de ‘come as you are’. Então é um processo bem natural, quase como um destino, quando o rock te pega, não solta mais (risos)”, diz Maia.
Mas essa resposta não foi completamente satisfatória. O Nada Pop está em São Paulo, com muita curiosidade sobre outras regiões do país. Aproveito para perguntar sobre as vantagens e desvantagens de que a região onde a banda reside proporciona. E, claro, como era o “cenário” por lá. Por sua vez, a baixista Renata revela que a quantidade de bandas novas que vêm surgindo em Pernambuco é bem intensa comparada a outros estados do nordeste. “Entretanto”, ela começa, “faltam mais casas de shows para que essas bandas possam tocar. Antes da pandemia já não haviam muitos lugares, e com seu advento, reduziu mais ainda, ao ponto de contarmos nos dedos o número de espaços que existem para tocar”.
Isso é algo que aconteceu em muitos lugares, e São Paulo não ficou de fora desse problema. Infelizmente, os espaços de lazer e cultura parecem ser os primeiros a sofrer com os problemas econômicos de determinadas regiões. Por outro lado, a resistência continua e de formas mais simples – dependendo do ponto de vista. A baixista da Slowner apresentou algumas ações alternativas para combater a falta de espaços, assim como acontece em diferentes outros lugares do país e, com certeza, no mundo.
“Os eventos autorais em Recife são financiados pelas próprias bandas, raramente se consegue ter algum lucro a partir disso. Apesar de ser um cenário bem desestimulante por falta de espaços e de editais de fomento, as bandas de Recife estão cada vez mais estreitando laços e se unindo, organizando shows com bastante frequência e buscando trazer bandas de outros estados”, finaliza.

Como ultrapassar a barreira RIO-SP?
Sobre as mudanças e propósitos que o lançamento de “Leading to Nowhere” trazia, não só com as apresentações ao vivo, mas também de uma possível aposta na carreira da banda um pouco mais arriscada por assim dizer, o grupo mantém um objetivo até o momento mais pé no chão: o de tocar e fazer shows. “Voltamos a tocar ao vivo apenas no início deste ano. Desde então, fizemos alguns shows em Recife e temos mais um marcado em Caruaru. Estamos focando na divulgação do álbum novo para conseguir tocar em outros estados e conquistar novos públicos”, ressalta Sena.
Sobre as bandas e lugares de Pernambuco que compartilham da mesma filosofia da Slowner, 0 baterista comenta que existe uma relação especial com o Stoned festival, por ser o evento que o grupo organiza para beber e para conhecer bandas de stoner de Recife. “Um salve pra Chico. Quem vem a Recife também não pode deixar de conhecer o Darkside, local que acolhe bandas undergrounds de vários estilos e de vários estados do Brasil. Um salve pra Diego”, diz.
Perto do fim da conversa, perguntei sobre como romper as distâncias? As redes sociais e plataformas de streaming ajudam nesse sentido ou nem tanto? Maia comenta que as plataformas ajudam a romper as barreiras da comunicação, mas a barreira financeira não (risos). “Brincadeiras à parte, a distância é um fator limitador na nossa parte ‘ao vivo’, principalmente porque o eixo Rio-SP é onde a maior parte da cena brasileira acontece, então sim, acredito que temos um pouco de desvantagem em relação às bandas de lá”.
Finalizo com a última pergunta, que apesar de não ser original, até que rendeu uma boa resposta. Afinal, por que o gênero Stoner? “Temos preguiça de fazer uma música com 1000 riffs diferentes e decorar 2000 passagens (risos). Então a gente cria alguns riffs e deixa a vibe fluir”, conclui o baterista.