
Sabe aquelas conversas que são tão honestas que você até saí com um outro olhar sobre as coisas? Aquelas conversas que acrescentam e que demonstram um pouco da importância que o seu trabalho possui? Sem falsa modéstia, mas são conversas como essa, realizada com o Dija (ou Dija Dijones, se preferir), que incentivam o nosso trabalho e estimulam ainda mais o nosso interesse em descobrir bandas e personagens dessa tal “cena” – entre aspas mesmo.
Com 32 anos, bacheral em direito e morador de Itapecerica da Serra, uma cidade distante 33 km de São Paulo, Dija (seu apelido), já tocou em diversas bandas. Entre elas podemos citar D-7, Decatron, Código Verona, Atol, Limassol, Wooley, Ocean Sea, e a lista continua… Algumas fizeram shows e gravaram alguma coisa, outras não. Fez breves participações em diversas outras e até tentou ser músico na noite.
Atualmente divide seu tempo dedicando-se a bandas como Chabad, Loyal Gun, Penhasco, O Apátrida, Schwarzenbach e, eventualmente, um tributo ao Bad Religion chamado de Stranger Than Fiction. O culpado de tudo isso, segundo o Dija, foi o Nevermind. Quando tinha 13 para 14 anos, a primeira TV a cores chegou na sua casa. Nela canais UHF.
Quando colocou em um tal canal 32, imediatamente começou a passar um clipe de uma galera enlouquecida em uma quadra de basquete. Era “Smells Like Teen Spirit” sendo exibido na MTV. No dia seguinte, comentou com um amigo da escola que por sua vez disse que o irmão alugou um CD que tinha essa música em uma videolocadora perto de casa. Era um tempo em que videolocadora locava mais CDs do que fitas VHS. Ele alugou o CD novamente, gravou em um K-7 e durante os seis meses seguintes só ouvia esta fita religiosamente todos os dias. Gastava quase toda a mesada em pilhas para “walkman”. Depois deste período, pediu um violão aos pais e decidiu que assim que aprendesse a tocar teria uma banda.
Confira nossa entrevista com o Dija Dijones e saiba mais sobre a música e sua vida. Acredite, você não irá se arrepender.
NADA POP – A Loyal Gun lançou recentemente o EP Bring Back Your Beat pela Howlin’ Records, conte um pouco sobre esse lançamento. Como surgiu a banda, quem são os outros integrantes e quais as características que diferenciam a Loyal Gun dos seus outros projetos?
DIJA DIJONES – Bring Back Your Beat é o primeiro dos dois singles que iremos lançar neste ano. O segundo, The Golden Ocean, está previsto para agosto. Ambos lançamentos se dão apenas em formato virtual. Escolhemos Bring Back Your Beat como nossa estreia oficial por entender que seria uma porta de entrada para nosso universo musical. A banda surgiu quase que casualmente. Eu tinha escrito algumas músicas entre 2007 e 2011 em inglês com bastante influência de rock alternativo dos anos 90. Em algumas letras, eu tive um amigo como parceiro de composição. Em 2012, ele comentou com o Fabio Barbosa (baterista que toca/tocou em diversas bandas como Gasolines, Modulares, Magic Crayon, Laboratório SP, Transistors, Tres Hombres, The Charts, Fotograma, etc.) que ficou interessado em fazer parte do projeto.

Eu não estava pensando em formar uma banda para tocar estas músicas, mas sabendo do interesse de um baterista como o Fabio, resolvi arriscar. Assim começamos a banda em 2013. A banda foi planejada para ser um quinteto com vocal feminino, mas depois de uma série de alterações na formação e dificuldades em encontrar uma vocalista, resolvemos consolidar a formação como trio, já contando com o Rafa Ap. como baixista desde meados de 2013, e eu resolvi assumir os vocais.
O Loyal Gun é um projeto totalmente diferente dos demais para mim. Na banda, exploramos referências como Superchunk, Sunny Day Real Estate, Swervedriver, Dinosaur Jr., Sebadoh, Superdrag, Ride, Teenage Fanclub, Versus, Hum, The Posies e diversas outras bandas gringas dos anos 90, sem esquecer bandas nacionais como Killing Chainsaw, Shed, Valv, Pelvs, Second Come, brincando de deus, Starfish 100, Pin Ups, Wry, Mickey Junkies e diversas outras. Basicamente, somos uma simbiose de grunge, shoegaze e powerpop.

NADA POP – Aproveitando, você pode falar sobre a Howlin’ Records? Afinal, quem são os fundadores do selo e qual a relação de vocês além da música? A gravadora é voltada para bandas alternativas e indie, certo?
DIJA DIJONES – A Howlin’ Records, até onde sei, é uma ideia que partiu do Bruno Pinho, um mestre quando o assunto é engenharia de som e afins (também baterista), e do Anderson Lima, do Estúdio Subway (também baixista do Blear e da Billy Negra) há aproximadamente 2 anos. O selo é voltado para bandas alternativas que basicamente bebem um pouco nesta fonte de sons quase inesgotável que foram os anos 90. Tanto os fundadores do selo como as bandas que pertencem ao seu elenco mantém um vínculo de amizade bem bacana. Por conta disso, a relação que existe é de parceria: todos procuram se ajudar da melhor maneira para possibilitar ao selo melhores condições de auxiliar as bandas. O plano de todos os envolvidos com o trabalho é para que daqui a algum tempo a Howlin’ seja um nome cada vez mais lembrado por aí como referência de um bom trabalho no meio independente.
NADA POP – Em uma conversa que tivemos pelo Facebook, você disse que participa de cinco bandas. Gostaria de saber como funciona esse envolvimento, pois tendo uma banda já considero complicado lidar com os horários e datas disponíveis para shows entre integrantes, cinco bandas então, considero uma tarefa árdua.
DIJA DIJONES – Era a encrenca que eu sempre quis! Sempre procuro ocupar todo o meu tempo com música: ouço, toco, penso, leio, escrevo executo música o tempo todo. Música para mim é algo tão essencial quanto comer, dormir, beber e respirar. Gosto tanto de tantas coisas relativas à música que uma banda só passou a não me satisfazer. Todos os projetos dos quais participo são diferentes entre si e abrangem um determinado nicho de sonoridades que admiro. Procuro organizar o meu tempo da melhor maneira possível para atuar satisfatoriamente em todos os projetos que participo e isto vai desde o cronograma de ensaios até o agendamento de shows. Em 14 anos tocando por aí, nunca tive problemas neste sentido. Sinceramente, esperto tê-los, pois isto significará que as coisas estão andando bem.

NADA POP – Muito se fala dos percalços que uma banda enfrenta por ser independente. Em sua opinião, quais são os principais fatores que “estragam” o nosso cenário atual e quais ideias você acredita que poderiam contribuir para uma mudança e melhoria do atual momento da “cena”?
DIJA DIJONES – Gosto sempre deste termo “cena” utilizando entre aspas. Antes, eu acreditava na existência de uma cena ou na necessidade da existência de uma. Hoje, penso de maneira diferente. Antes de mais nada, não creio na aplicabilidade do termo “cena”, pois o que temos são vários agrupamentos de artistas em diferentes locais procurando sobreviver, lançando seus trabalhos do jeito que dá e tocando nos locais que estiverem ao seu alcance, não havendo uma intercomunicação efetiva entre eles. Somos um cardume que vaga pelo mar em diferentes direções, ainda que queiramos a mesma coisa: sobreviver.
Creio que precisamos da consolidação do conceito de comunidade no âmbito independente, de maneira a gerar iniciativas que resultem em uma economia alternativa e autossustentável para todos no futuro. Ou seja: precisamos reunir estes agrupamentos de artistas de maneira a conseguir ocupar um espaço efetivo que todos possam alcançar e conscientizar o público da importância de seu papel na construção de uma realidade mais justa para todos: uma realidade onde os espaços tenham uma estrutura mínima adequada, as bandas possam mostrar seus trabalhos da melhor maneira e sejam remuneradas, bem como, o público pague um preço aceitável para entrar em um show, comprar um CD, um DVD ou uma camiseta.
O que vejo ainda é cada um correndo atrás do seu, do jeito que dá, quando não está comprometido com seu emprego das 9h às 6h e fazendo hora extra. Falta um olhar mais fraternal aos nossos iguais em algumas ocasiões. Já temos a desvantagem de fazer parte de um meio que produz música historicamente nada popular em um país onde cultura é um tema sempre subestimado e a música tratada como mero entretenimento sem significado substancial. Tem muita gente de banda que não prestigia shows de bandas na mesma condição, só faz um esforço quanto toca, mas nenhum para prestigiar um semelhante. Não estou falando em praticar condescendência. Vivemos um período criativo excepcional com bandas excelentes tocando em vários muquifos por todo lado. Quem quiser ver, basta sair de casa. Mas não é a estes fatores que devemos nos prender.

Existem inúmeras iniciativas independentes que buscam reverter este quadro. Aos poucos, percebo que surgem boas iniciativas e têm muita gente boa procurando fazer a intercomunicação acontecer. Alguns crowdfundings que têm rolado por aí são um exemplo: os fãs ajudam uma banda, esta banda lança um disco ou faz uma pequena tour e convida outras bandas para tocar. Pipocam ainda por aí fãs de música e/ou músicos que organizam pequenos festivais, espaços que possibilitam o acesso a bandas novas ou menos conhecidas, bandas tocando na rua… Porém, é só o começo. Temos um longo e árduo caminho ainda para percorrer. Assim como tem muita coisa a ser ajustada ainda. Todavia, os primeiros passos estão sendo dados. Por conta disso, ainda que pareça utopia, creio em condições melhores para os artistas independentes no futuro.
NADA POP – Entre as bandas que você possui contato, seja pela gravadora mesmo ou por contatos pessoais, quem você vem observando e indicaria para os ouvidos curiosos?
DIJA DIJONES – Não é porque fazem parte do selo, mas indico o casting todo: Twinpine(s), Chalk Outlines, Vapor, Blear, Billy Negra, Penhasco, MonstroMonstro, Poltergat e Gomalakka. E ainda têm bandas como Hollowood, Blues Drive Monster, We Are Piano, Pollux & Castor, Odradek, Sky Down, The Bombers, CHCL, Malvina, La Carne, Maru, Wiseman, Der Baum, Ronca e muitas outras, sendo que garanto ao leitor que ao menos uma ele vai gostar de verdade.

NADA POP – Sendo bacharel em direito, assim acredito que sua carreira profissional possa ser mais fácil de alguma forma em comparação com a música – que convenhamos não é nada fácil. Tente explicar um pouco desse sentimento de se envolver apenas com a música e qual o chamado que ela faz diariamente pra você.
DIJA DIJONES – Na verdade, a minha carreira profissional foi algo que simplesmente aconteceu, não foi algo pelo qual optei. Agora que estou desempregado, estou repensando a vida. Sempre sonhei e ainda sonho em viver de música de alguma maneira, nem que seja carregando piano, desde que isso me possibilite pagar as contas e prosseguir com meus projetos musicais.
Quando você não vive daquilo que realmente ama, a vida é mais cinzenta e opaca. Há quem ama, desiste e tenta conviver com a frustração o resto da vida. Há quem ama e continua tentando de alguma maneira. Eu continuo tentando porque a música é essencial na minha vida. Ainda sinto arrepios quando ouço uma música que me atinge em cheio. Ainda consigo manter o equilíbrio emocional ouvindo as músicas que me servem de terapia. Ainda faço bons amigos por causa da música.
Ainda continuo com a certeza de que eu sou realmente eu apenas quando estou envolvido pelos sentimentos que a música me causa, seja quando estou lendo, ouvindo, compondo ou escrevendo, como agora. Quando a música não tiver mais este significado, eu simplesmente estarei morto.

NADA POP – A música nos proporciona alguns momentos de intensa emoção, desde que você começou a tocar, quais os dois momentos que irão ficar eternizados em suas lembranças e por qual motivo?
DIJA DIJONES – Foram dois episódios distintos, mas que tiveram um significado muito grande para mim. O primeiro foi em 2009. Estava tocando em uma madrugada de terça para quarta para praticamente ninguém. Em um determinado momento, entrou um sujeito aparentemente bem bêbado que ficou enlouquecido com a música. Ao final do show, ele disse que estava magoado, entrou no local casualmente, viu o show, adorou e a noite dele havia sido salva. Isso fez aquela noite valer a pena. O outro foi no Espaço Cultural Walden, em um dos seus últimos shows em 2013. Seria o último show do Chabad, mas o show e a energia que o pessoal que lotou o lugar foram tão surreais que a banda prossegue até hoje. A partir destes episódios, em todo e qualquer show que faço, mesmo que seja para uma única pessoa, procuro dar o meu melhor e sempre procuro a melhor maneira de conectar quem está assistindo à música que faço.
NADA POP – Para encerrar, gostaria que você deixasse abaixo os links de todos os seus projetos, informações que acredita que podem ser úteis e qualquer outro recado que tenha interesse. Obrigado pelo papo e até breve!
DIJA DIJONES – Antes de mais nada, quero agradecer pelo espaço e pela oportunidade de poder falar um pouco sobre o que mais gosto: música! Sou um fã do Nada Pop, já acompanhava o site e é uma imensa alegria ter uns caracteres sobre mim no site. Tamo junto! Bem, para quem quiser ouvir meus trabalhos:
– Chabad: é o projeto que compartilho com meus amigos-de-fé-meus-irmãos-camaradas Guilherme Braz Prado (guitarra) e Diego “Champ” (bateria). Misturamos referências da Dischord Records (Fugazi, Faraquet, Medications, etc.) com a Vanguarda Paulistana (Arrigo Barnabé, Patife Band, Itamar Assumpção, etc.) e referências a Aristóteles, Oscar Wilde, Aldous Huxley e George Orwell nas letras em português. Este ano teremos 3 músicas lançadas no 5-way split chamado “mónó”. O primeiro disco já está em fase de pré-produção.
https://www.facebook.com/chabad.oficial
https://soundcloud.com/chabad
– Loyal Gun: é o projeto no qual mais tenho trabalhado ultimamente. Meus parceiros Rafa Ap. (baixo) e Fabio Barbosa (bateria), me ajudam nesta empreitada que bebe no rock alternativo dos anos 90 (Superchunk, Sunny Day Real Estate, Swervedriver, etc.), mas também se inspira em referências como Hüsker Dü, Wipers e Neil Young. O primeiro single foi lançado no fim de maio, o segundo deverá vir em agosto e o disco em 2016:
https://www.facebook.com/LoyalGun
https://loyalgun.bandcamp.com/
– Penhasco: é uma banda para qual fui convidado a entrar e, no fim, acabei fazendo bons e novos amigos, como o Eduardo “Boqa” Santana (já entrevistado aqui), Luciano Portela (baixo), Fernando Oliveira (guitarra) e Bruno Duarte (bateria). As influências transitam entre Tomahawk, Tool e Deftones. O primeiro EP, “Quantos Deuses Devemos Matar?” está para ser lançado e o primeiro disco está em processo de pré-produção:
https://www.facebook.com/penhascorock
https://penhasco.bandcamp.com/
– Schwarzenbach: sou apenas eu e meu violão. Minha paixão pelo folk de Nick Drake, Elliott Smith, José González, Josh Rouse e Kings Of Convenience norteiam este trabalho, totalmente do it yourself. Lancei o primeiro EP ano passado, “Time Is An Illusion” e este ano pretendo lançar um full-length:
https://www.facebook.com/dija.dijones
https://schwarzenbach.bandcamp.com/
– Ainda para este ano (se tudo der certo): inicio a pré-produção do primeiro full-length do D-7, minha primeira banda (rock nacional inspirado por bandas como Jimmy Eat World, Weezer, The Dears e outros com letras em português) e o primeiro lançamento d’O Apátrida, meu projeto mais recente, focado em pós-punk, coldwave e death rock (Joy Division, Asylum Party, Christian Death, etc.) com letras em português inspiradas em Augusto dos Anjos, Albert Camus e literatura beat.