
No terceiro dia do nosso especial intitulado 5inco dias de Mollotov, em referência ao lançamento do primeiro full álbum do Mollotov Attack, chamda O Home é o Que o Homem Faz, trazemos nesta quarta-feira uma entrevista muito bacana com a banda.
Nesse papo você confere um pouco mais sobre a filosofia do grupo, irá saber sobre as dificuldades de um cenário independente muitas vezes hostil, o lançamento na marra do álbum e um pouco sobre as histórias de algumas das músicas do álbum. Confere aí e vale lembrar que o álbum está à venda no site Microfonia.net.
ENTREVISTA MOLLOTOV ATTACK
NADA POP – Pensando na faixa “O homem é o que o homem faz”, que dá nome ao álbum, gostaria de saber o seguinte: as bandas independentes, na opinião de vocês, estão realmente dispostas a fazer sacrifícios em prol da sua própria música?
Didi – Eu acho que sim. A cena independente já vem de muita resistência, são muitas barreiras superadas desde o início das primeiras bandas punk do Brasil, há 40 anos praticamente. É tipo “faça você mesmo” até hoje. Se você não se sacrificar por isso não consegue seguir na cena por muitos anos.
Bollaxa – Creio que não dá pra generalizar afinal cada banda faz o corre que pode fazer. Como se trata de underground sacrifícios são constantes e necessário para atingir os seus objetivos, acho nem só em relação à banda, mas em relação a vida.
Cyco – As verdadeiras estão. As que não estão não duram. Até porque ter uma banda independente é basicamente fazer sacrifícios. Você acaba tendo que escolher entre coisas extremamente importantes e sacrificar uma delas. Momentos com a família, passeios, descanso… É injusto. Acho que a grande pergunta é o quanto mais cada um pode se dar ao luxo de sacrificar.
NADA POP – Contextualizando a minha primeira pergunta, soube que a realização desse álbum possui muito suor, superação de barreiras (não só econômicas), além dos próprios limites internos. Quais histórias estão por trás desse disco (citem ao menos uma)?
Cyco – Esse foi aquele parto de fórceps. Tudo foi difícil. Tudo deu errado. Foi um grande exercício de perseverança, de resistência. Tivemos que colocar a prova o quanto acreditamos no que dizemos nas letras. Gravamos a bateria duas vezes porque não estávamos satisfeitos com o andamento de algumas, o Davi mixou o disco duas vezes porque não estava satisfeito com o resultado da primeira, perdemos o prazo pra lançar, a crise econômica devastou os selos e por pouco não perdemos o pouco apoio que tínhamos… Foi tenso!
Bollaxa – Vou contar a história por trás da música “No caminho do lixo”. Estávamos em frente ao Hangar 110, eu e o Cyco, após algum show (provavelmente o Punk na Páskoa) e como de costume encerrando as apresentações os funcionários do Hangar começam a limpar, tanto dentro do salão como a calçada. Estava eu lá parado, meio bêbado moscando quando veio o funcionário veio limpar e eu no meio, atrapalhando. Aí o Cyco falou: “Oh Boll, sai aí do CAMINHO DO LIXO!!” Na mesma hora olhei pra ele e disse: “isso aí é nome de música!!” No próximo ensaio, que foi na quinta feira eu estava com a base e letra, tudo pronto.

NADA POP – Gostaria que vocês falassem da importância das participações especiais do disco. Mais da metade do álbum conta com alguma participação, alguma delas possui um significado especial para vocês?
Bollaxa – Participações especiais têm em todos os nossos discos, desde a demo. A gente sempre se identificou com esse lance porque deixa o álbum mais interessante, até porque ao vivo é mais difícil de rolar essas participações. Todas são igualmente especiais: Bajul (Programa Ódio Mortal & Coletivo Refuse/Resist), Bux Aopless & Edy Tula (Loucos d’La Mente), Gepeto (Ação Direta e Letall), Tonhão (DownHatta) e Mori (Biting Socks – México). Todos foram especiais em minha opinião, cada um de uma forma. Seria injusto destacar só uma pessoa (hahaha).
Cyco – Essas participações são uma extensão das amizades que fizemos nesses anos de estrada. São coisas que quando fazemos as músicas às vezes já imaginamos “pô, essa parte é a cara de tal pessoa”. E é uma honra quando eles aceitam e tornam essas músicas ainda mais especiais pra gente.
Didi – Todas foram especiais em minha opinião. Cada um encaixou perfeitamente a música que escolhemos para eles. Muito obrigado a todos.
NADA POP – Falem sobre a gravação e produção do álbum. Quem ficou responsável pelas gravinas e há quanto tempo vocês estão preparando o lançamento desse álbum? E sobre a arte do álbum, quem fez?
Cyco – A história desse álbum começa em 2014, quando gravamos a primeira pré. De lá pra cá entraram músicas, saíram outras, mudou a afinação, arranjos, letras… Mas no fim acho que esse tempo foi importante. As músicas chegaram à sua forma definitiva. Estão maduras.
Gravamos com o Fabio Godoy, que além de conhecer demais do estilo e da parte técnica nos dá total liberdade no estúdio e abraça todas as ideias malucas que propomos. A mixagem e finalização ficaram a cargo do Davi Baeta, com quem já trabalhamos algumas vezes e que tirou o melhor som possível desse material.
A arte da capa foi feita pelo desenhista e tatuador Eduardo Viriato. Um cara que tem tinta na veia, extremamente talentoso. Ele ouviu a faixa título, deu uma sacada na letra, e no primeiro esboço já chegou com essa maravilha! O cara é um monstro! Como tudo no Mollotov é feito entre amigos ainda temos as fotos do encarte por Caio Wigtenbroek, Juliana Marotta, Marco del Giorno, Daniel Oliveira, Felipe Cabello e arte final do Toni Oliveira (Dissidentes). Também é fundamental falar do apoio do selo Microfonia, que mesmo sem ouvir uma nota gravada já abraçou esse projeto e nos deu todo o suporte nessa caminhada.
NADA POP – As letras do Mollotov continuam na mesma pegada de contestação, ressaltando os valores da amizade e jogando na cara alguns podres da sociedade. A banda é fruto daquela vida que muitos de nós conhecemos: a periférica, o povo que precisa acordar cedo, suar muito para pagar as contas e aguentar os sapos de uma classe que sequer imagina viver o que vivemos. No entanto, o povo parecer preferir ouvir músicas que não dizem nada e que só falam de amor. Existe alguma explicação para isso na opinião de vocês? O hardcore tem falhado em algo?
Cyco – Somos um povo com enorme déficit educacional, que vive pra trabalhar, que sofre demais, muito mais do que o necessário. Às vezes a única paz que esse povo encontra é nessa música que não diz nada, que o faz rir um pouco ou dançar. Não sei se o hardcore falha, mas é mais fácil se identificar com a mensagem de uma música que fala de amor do que ter que parar pra pensar sobre estrutura e condição social, etc. Falta informação. Ou talvez nós estejamos falando pra quem já sabe. Não estejamos alcançando o público que deveríamos. Seria o caso de tentar abordagens mais populares? Quais? Ou será que o fato do maior acesso das pessoas às informações proporcionadas pela internet irá fazer esse papel? Sinceramente eu não sei.
Didi – O hardcore nunca falhou. É música para merecedor, música pra quem tem cabeça boa, que tem atitude e deseja de alguma forma mudar a merda que é nosso país.
Bollaxa – Acho que gosto é gosto. THE ADICTS, SOCIAL DISTORTION, RAMONES, THE UNDERTONES, THE CLASH entre outros clássicos do punk rock abordam temas de protesto e sempre falam de amor. Acho válido também, afinal quem nunca amou alguém que atire a primeira pedra!
Aí cabe a proposta da banda. Mollotov Attack é uma banda que fala dos assuntos que você citou na pergunta e sempre seremos assim, porque essa é a nossa proposta. Acordar o povo, e não falar sobre experiência de relacionamento diretamente.
Curiosidade: a letra da música “Sempre em frente” pode se adequar ao assunto, já que escrevi após um fim de relacionamento de quase cinco anos e sim, eu precisava seguir sempre em frente.

NADA POP – Vocês também organizam ou ajudam na realização de shows, principalmente no ABC Paulista. Seria isso o que falta para uma cena independente mais forte, essa contribuição e participação de eventos que não sejam só aqueles que a banda se apresenta? Como reconhecer uma banda aliada de uma banda sanguessuga?
Cyco – Sim, estamos sempre envolvidos na produção de conteúdo cultural através dos coletivos que fazemos parte e/ou apoiamos, como o Refuse/Resist e o Da Rua Pra Rua. Acho que o que falta pra uma cena mais forte é entender todos os elementos envolvidos nela e passar a fazer as coisas nós mesmos (DIY), mas bem feito. A cena não são apenas as bandas. Faltam fotógrafos, jornalistas, artistas plásticos, técnicos de som e iluminação, confecção, restaurantes com opções veganas, por exemplo… Tem espaço pra todo mundo. É praticamente reconstruir a sociedade, mas de uma forma inclusiva e justa. Pode ser a chance que muitas pessoas buscam de trabalhar com o que lhes faz feliz. É possível. Eu estou vendo acontecer!
Bollaxa – A cena independente como o nome já diz é independente, ou seja, faça você mesmo. A gente estava cansado de participar de festivais em que as bandas eram desvalorizadas. Praticamente pagavam pra tocar em festivais onde cobram entrada e não dão estrutura básica para a banda.
Formamos o Coletivo Refuse & Resist para como o próprio nome diz se recusar a aceitar essa cena e resistir a esses parasitas que só organizam festivais pela grana e querem que os músicos se fodam.
A gente respira punk, bebe hardcore e vive pra isso. Vamos até o fim. Organizamos festivais justos, para todos, da forma que gostaríamos de ser tratados, com respeito e valorização do nosso trampo. Creio que por isso a galera sempre fala bem do coletivo e tem dado certo.
Sobre banda sanguessuga e aliada (hahahaha) só o tempo irá dizer. A mentira corre e cansa, enquanto a verdade anda e alcança.
Didi – A estrada nos ensina muito. Em cada lugar que passamos aprendemos de uma forma diferente de organização, e com isso, nessas estradas da vida, a gente tenta fazer o possível e impossível, na melhor forma de organizar um evento que possa ter uma estrutura boa e o máximo de respeito que a banda merece receber. Sobre bandas aliadas ou sanguessuga é só abrir uma cerveja e sentar-se à mesa. Ou a ideia bate (se bater desce mais uma) ou se não bater é tchau.
NADA POP – Para concluir, porque esse é só o final da primeira parte desse papo, gostaria que vocês falassem um pouco sobre a produção do clipe da faixa “Escolha”. Quem fez, onde foi gravado e qual era a ideia que vocês queriam transmitir? Dá para citar algumas das participações no vídeo?
Cyco – Um dia tocamos nesse lugar, uma pista de skate chamada “A rua chopp”, que tem um visual e uma energia incríveis. O Bollaxa olhou pra dentro e já teve a ideia de gravar um clipe ali. O trampo ficou com os nossos parceiros da Insanidade Films, que compraram a briga e colocaram todas as loucuras que propusemos em prática. Esse é um clipe da galera. Uma homenagem da banda pra todos esses amigos que sempre nos apoiaram e que assim como nós se orgulham das suas escolhas.
Bollaxa – Essa letra é bem simples de entender, não tem mensagem subliminar nem nada (hahaha). A princípio foi feita sobre a escolha de fazer parte do movimento punk, afinal faço parte desse corre antes de ter banda. Essa letra foi feita creio que em 2011 mais ou menos, porém é uma letra que não fala somente disso, ser punk (escolher o punk). Foi tema inicial, mas ela serve para muitas outras escolhas que temos na vida como passa no clipe. Cada um é de uma forma e cada um batalhou muito para chegar onde está hoje e merece ser respeitado por isso. Lógico que tem muito fdp, pilantra por aí. É o que mais tem. Seja como for seja você mesmo e respeite as escolhas dos outros. Lógico que isso não se aplica a racistas, fascistas, homofônicos entre outros imbecis que esse mundo podre criou.
As participações foram de pessoas que fazem parte da história da banda, que correm com a gente. Obviamente faltou muita gente, mas a galera que estava lá representou muito e conseguimos passar a proposta da música.