Vai comer o quê?
Cresci nos anos 80, vi a movimentação para as Diretas Já, mas era moleque, não entendia nada de política. Minha participação nesse movimento se resumiu a participar de um concurso de frases do suco em pó Tang, a frase que enviei foi “Diretang Já”. Acho que os jurados não entenderam o peso político do suco em pó no processo de redemocratização do país e eu não ganhei o prêmio, que era um buggy verde para crianças. Melhor assim, eu ia acabar me fodendo todo num poste com aquele buggy-mirim. Depois veio a patacoada Caras Pintadas. O canal de televisão Groba elegeu e derrubou o Collor (eu penso assim, me explica de outro jeito se souber mais direitinho!). Tocava grunge, cena e música da qual nunca gostei, acho chato como uma praia paranaense. Faltou molho para o grunge, ainda prefiro a rispidez do Bad Brains, Dead Kennedys e Olho Seco que na época tocava nas minhas fitinhas K7. Demorou um pouco e depois dessa salada veio a internet como prato principal.
Argumento que ouço – “Pô bicho, mas ficou tudo mais fácil, eu ouço banda da Islândia e de Sorocaba,baixo tudo.”
O Orkut acabou graças a Jah, veio o facebook e todo mundo tá clicando e falando de tudo e de todos. Fofocaiada das braba. A vizinha que espiava o bairro inteiro de seu muro e comentava da “filha da Neuza que tava saindo com o traste do filho do Chico da oficina” liberou geral e eu posso descer o sarrafo em banda, vizinho, site e em quem mais quiser sem me preocupar com o que acontece depois (maizomeno né!). O que se faz no facebook, fica no facebook? Nem sempre. Você encontra o canalha do seu amigo virtual que é “gente de bem, defende a família e odeia viado” e até aperta a mão dele na festa que tá rolando na casa daquele seu brother que é indie, conhece um monte de banda, mas não paga 10 conto num CD da sua banda. Se for uma cerveja importada na Vila Madalena ele paga até 50,00.
– Pô bicho, dá um desconto, você é maior pessimista!
O Ignacy Sachs (economista dos bons) disse que “o pessimista é um otimista bem informado”. Hoje tá tudo aí pra nós na internet, é só saber chegar (Brown, Mano, 2002). Até a revolta está disponível… …essa semana vamos nos unir virtualmente contra o quê? Esperemos a próxima tragédia.
Dizem (sei porra nenhuma de psicologia) que o trauma serve, por vezes, para alterar a conduta do indivíduo. Pós-trauma ele se cuida para não mais repetir os atos que o levaram a ter dor, desconforto ou perda. Nossa sociedade, nosso tempo, nossa época, vive uma sucessão de traumas sucedendo sucessivamente. É tanto tiro, porrada e bomba (Popozuda, Valesca, 2015) que o trauma é o normal, é nosso dia a dia. Mas eu queria mesmo escrever sobre a banda Chabad, vi um show deles tempos atrás e foi foda de bom! Acabou que comecei citando o Collor (isso dá maior zika), passei pela internet e terminei sei lá onde.
Gosto de matar não… …mas se precisar matar eu mato!
Eu curto Crust.
Curte aí!
(Semana que vem vou escrever sobre pescadores urbanos, sei nada sobre o assunto!)
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*Rafael Moralez é músico, ilustrador e autor da série Peixe Peludo. Conheça seu blog de ilustrações clicando AQUI.